Conheça a história de Enzo, paciente da APO que tem um distúrbio raro que causa obstrução intestinal

Jessica Fagundes e Enzo Miguel, portador da Doença de Hirschsprung

O Enzo Miguel, hoje com três anos, precisou fazer uma cirurgia de colostomia com apenas 26 dias de vida. Uma semana depois, foi necessária nova intervenção cirúrgica, desta vez uma ileostomia. Os problemas de saúde enfrentados desde cedo pelo menino são decorrentes de um distúrbio raro chamado Doença de Hirschsprung, que acarreta a obstrução parcial ou total do intestino baixo e afeta cerca de um em cada 5 mil recém-nascidos.

Como a doença não é detectada nos exames pré-natais, seus pais, que na época moravam no município de Vilhena, no interior de Rondônia, descobriram o distúrbio horas depois do nascimento, já que Enzo não mamava nem evacuava. Após exames, foi descoberta a obstrução intestinal e, com a suspeita da Doença de Hirschsprung, a família precisou deixar o estado natal e se deslocar para Cuiabá, no Mato Grosso, para ter melhor acompanhamento médico. Enzo só teve alta hospitalar três meses após o nascimento.

Ao receber a alta, a família voltou para Rondônia e permaneceu lá até o menino completar dois anos. Quando completou a idade, em janeiro de 2022, Enzo e sua mãe, Jessica dos Santos Fagundes, vieram para Curitiba para fazer a cirurgia de reversão da colostomia e ileostomia. O procedimento foi feito semanas depois, mas os meses seguintes foram de complicações de saúde.

“Depois da reversão foi uma luta. Houve muitas cólicas e intercorrências. Ele não conseguia comer direito, perdia muito o apetite”, diz Jessica. “Íamos semanalmente ao hospital para ele tomar soro, porque desidratava. Aí, sete meses após a reversão, chegou um momento em que ele parou de evacuar, e o intestino dele perfurou”.

Com a família novamente em Rondônia, sem a estrutura médica necessária para o atendimento, Jessica e Enzo precisaram pegar um voo para Curitiba com urgência. Logo que chegou ao hospital, constatada a perfuração intestinal, foi feita nova cirurgia de ileostomia. “Se estivéssemos em Curitiba durante a recuperação da reversão, com a estrutura necessária, nada disso teria acontecido. Mas a demora devido à falta de recursos em Rondônia levou a essas complicações maiores. Agora decidi ficar em Curitiba. Mas aqui só estamos eu e o Enzo. Meu marido precisou ficar no Mato Grosso trabalhando”.

Participação na APO

Depois da confecção da nova ileostomia, a saúde e a disposição do menino melhoraram. Hoje ele faz acompanhamento médico para em breve proceder novamente com a reversão. Desde setembro do ano passado, Jessica e Enzo passaram a frequentar a APO para atendimento e encontros da associação. “Quando conhecemos a APO fiquei muito feliz em poder participar, porque estamos nós dois sozinhos morando em Curitiba. Não temos ninguém. Desde então estamos indo todo mês. Ele gosta de lá, quando chega fica feliz. Ele chama a Luiza, ex-presidente, de ‘vovó’. Para nós é muito bom”, conta Jessica.

Redes sociais

Com as experiências e o conhecimento adquiridos durante esses três anos lidando com a condição de saúde do Enzo, Jessica decidiu criar um perfil no Instagram para ajudar outras famílias que estejam passando pelos desafios da adaptação à Doença de Hirschsprung. A conta @enzo_miguelff já soma mais de mil seguidores e traz postagens sobre o dia a dia do menino e o cuidado com a doença.

“O objetivo desse perfil sempre foi ajudar pessoas que estão começando a lidar com isso agora e ajudar com experiências nossas. Quando o Enzo nasceu, eu nunca tinha ouvido falar dessa doença. Eu pesquisava na internet sobre como cuidar e não achava quase nada, e no hospital eles só ensinam o básico. Então como para mim foi tão difícil aprender, criei esse Instagram para colocar tudo o que eu sei e ajudar outras mães”, conta Jessica.

A saúde em seu conceito mais amplo

Por Glória Marcondes
Enfermeira estomaterapeuta e assessora técnica da Casex

A palavra “salutogênese” significa origem da saúde. É um termo cunhado por Aaron Antonovsky para designar a busca das razões que levam alguém a estar saudável. Este conceito foi oposto ao vigente na época (anos 60 do século XX) de patogênese, que significa “origem das doenças”. É, portanto, colocar o foco no que traz saúde e bem-estar. A partir de uma estrutura cognitivo-emocional-social, são os elementos internos que auxiliam a pessoa na superação das dificuldades que surgem na sua vida.

A palavra está relacionada à questão da espiritualidade como cultivo interno, à qualidade de vida e sanidade e à resiliência do indivíduo diante dos desafios. Resiliência humana é a capacidade de o indivíduo sobrepor-se e construir-se positivamente frente às adversidades.

Tornar-se uma pessoa ostomizada, por exemplo, não é uma escolha de vida, mas uma condição aceita e necessária para contornar um problema de saúde. A pessoa com estomia pode encarar essa nova condição com otimismo e promover uma reconstrução pessoal mais ampla, ou desanimar e sucumbir frente ao desafio, trancar-se em casa, evitar o contato com amigos e parentes, etc.

Reunir-se em associações traz muitos benefícios e está em afinidade com o conceito de salutogênese. As trocas de experiências e cuidados específicos são salutares. Encontrar meios de superar problemas em conjunto é mais fácil do que individualmente. Lazer e momentos de descontração são excelentes para a saúde. Aprender em grupo sobre as condições de saúde favoráveis é muito interessante, pois a dúvida de um serve para mais pessoas. Sem contar que apesar de os dispositivos para pessoas com ostomia serem garantidos pelo governo e pelos planos de saúde privados, quando há um grupo de interesse há mais força para garantir as conquistas e gerar novas.

Para a salutogênese, são decisivas as seguintes questões:

• Como aprendo a lidar com qualquer situação na vida, mantendo a minha flexibilidade interior e exterior?

• Como posso tornar-me tolerante a frustrações e ao estresse, e estável no meu caráter?

Difícil encontrar as respostas. Certamente não será uma receita de bolo, pois terá a individualidade agindo. Inclusive, estar no grupo da APO pode fazer com que se consiga enxergar outra saída para uma questão semelhante na qual alguém a resolveu de outra maneira, ampliando visões e caminhos para resoluções de conflitos futuros.

Alimentação saudável e ingestão de água adequada, quantidade e qualidade de sono, encontrar familiares e amigos, conversar, passear, ter uma vida plena… Tudo isso é salutar e faz parte da salutogênese.

Neste final e início de ano, com as festas, confraternizações e férias, podemos curtir muito, aproveitar os momentos felizes e ao mesmo tempo cuidar para não cometer exageros, para nos mantermos tranquilos e em paz.

Os funcionários e a diretoria da empresa Casex desejam a todos que 2023 venha com possibilidades de alegrias, prosperidade, paz e muitas situações salutares!

* Artigo publicado no jornal da Associação Paranaense dos Ostomizados

Conheça Katia Oliveira, a nova presidente da APO

Katia Oliveira, eleita presidente da APO em assembleia realizada em novembro de 2022

Eleita em assembleia realizada em novembro do ano passado, Katia Pascoal de Lima Oliveira, de 45 anos, é a nova presidente da APO e estará à frente da associação pelos próximos dois anos. Portadora da doença de Chron há 12 anos, Katia tornou-se ileostomizada em janeiro de 2018 e desde aquele ano passou a frequentar a associação. Esposa, mãe e avó, ela é formada em Bioquímica e trabalhou na área até aposentar-se por invalidez em decorrência dos problemas de saúde.

Em seu mandato, a nova presidente pretende focar em aumentar o volume de informações sobre ostomia em Curitiba e região metropolitana, trazer mais voluntários à entidade e dar seguimento ao trabalho da associação no atendimento diário aos ostomizados, na interlocução com o SUS e em demais ações para a melhoria da qualidade de vida dos pacientes atendidos.

Jornal APO: Como você se tornou ostomizada?

Katia Oliveira: Meu diagnóstico da síndrome de Chron demorou um ano pra ser efetivado, e para o tratamento foram mais dois anos. Então a doença começou a avançar muito rápido. Cheguei no estágio 4, que não tem mais como voltar. São raríssimos os casos de pessoas que chegam nesse estágio. No Brasil não tenho certeza se sou só eu ou se tem mais alguém. Até uns quatro anos atrás eu sabia que era só eu, hoje não tenho certeza. Chegou num ponto em que tive que tirar todo o meu intestino baixo, porque estava todo infeccionado. E foi aí que me tornei ileostomizada, há cinco anos.

Jornal APO: Como conheceu a APO?

Katia Oliveira: Antes de eu sair do hospital, recebi a visita do enfermeiro estomaterapeuta Thomas, que já atendeu na APO, para me ensinar a usar a bolsa. Se hoje ainda não existe tanta informação sobre a vida de um recém-ostomizado, naquela época havia ainda menos pessoas que falavam sobre isso até mesmo na internet. Não tinha ninguém para me ajudar a entender que minha vida poderia ser normal. Eu tinha medo da ostomia, pensava que não iria mais poder ir à praia ou usar alguns tipos de roupa.

Quando saí do hospital, o Thomas deixou o telefone dele caso surgisse alguma dúvida ou dificuldade e entramos em contato por diversas vezes. Em uma dessas conversas ele disse que existia a associação e me convidou para conhecer. Na época eu ainda não conseguia sair de casa, mas depois de um tempo consegui ir.

No começo da ostomia, foi muito difícil até mesmo sair de casa. Naquela época contei muito com meu marido, ele sempre foi muito parceiro e ficou muito do meu lado. Então conheci a associação e conheci a enfermeira Maria Carlos, que me atendeu por bastante tempo. Eu não sabia nem como tomar banho com a bolsa e ela me ensinou tudo, como fazer quando fosse para a praia, tudo.

Também tive problemas de aceitação da ostomia, então recorri à psicóloga da APO, e também à nutricionista. Lembro que quando eu chegava lá, os voluntários diziam para eu ir só para conversar mesmo que não fosse pra ser atendida, e essa acolhida ajudou bastante. Nessa fase a associação foi extremamente importante para mim.

Jornal APO: O que representa ser presidente de uma entidade como a APO, que foi importante para você num momento desafiador da sua vida?

Katia Oliveira: Eu já tive dificuldades em relação à retirada de bolsas na unidade de saúde, mas sou uma pessoa que vai atrás até resolver o problema. Fico imaginando quem não consegue resolver esses problemas e fica quieto. Tem que ter pessoas para ir atrás por elas. Aceitei a presidência justamente para isso, e também para ajudar a levar informação sobre a ostomia. Porque por mais que hoje tenha mais informações do que antes, ainda é pouco. Precisamos abranger o máximo de pessoas.

Jornal APO: Quais são seus principais objetivos no mandato à frente da associação?

Katia Oliveira: Pretendo tentar humanizar o máximo possível a situação dos ostomizados nos postos de saúde, tentar trazer mais voluntários, tentar fazer mais campanhas para aumentar o conhecimento sobre a ostomia, fazer mais eventos. Meu foco principal é aumentar a informação sobre ostomia.

Estão surgindo muitas coisas e pretendo fazer o máximo que puder. A Luiza [ex-presidente] fez muita coisa e eu quero caminhar com ela o máximo que puder para aprender e conseguir dar minha contribuição.

Movimento tenta criar dia do ostomizado em Portugal para combater preconceito contra ostomia

No Brasil, o Dia Nacional do Ostomizado, celebrado em 16 de novembro, é uma realidade desde 2007

Valéria Pinheiro, presidente da ANOXV e uma das líderes do movimento Ostober (Foto: Divulgação)

No dia 1º de outubro, o movimento chamado Ostober, criado em Portugal com o objetivo de dar voz às pessoas ostomizadas e eliminar preconceitos em relação à ostomia, lançou um abaixo-assinado on-line para pressionar as autoridades do país a criar oficialmente o Dia Nacional do Ostomizado.

O Ostober foi criado pela Convatec em parceria com a Associação Nacional de Ostomizados (ANOXV) de Portugal. Para Valéria Pinheiro, fundadora e presidente da associação, a criação da data oficial traria luz acerca da ostomia, que atinge cerca de 15 mil ostomizados portugueses. “O desconhecimento gera preconceito e exclusão, por isso criar o Dia Nacional da Pessoa com Ostomia vai trazer condições para eliminar definitivamente o desconhecimento da sociedade portuguesa sobre o que é a ostomia”, afirmou Valéria ao Jornal Médico. 

No Brasil, o Dia Nacional dos Ostomizados foi instituído pela Lei nº 11.506, de 2007 como forma de tentar acabar com o preconceito por meio da informação. Na época em que a lei foi sancionada, a Associação Brasileira dos Ostomizados (Abraso) estimava que havia aproximadamente 50 mil ostomizados no país. Segundo o último levantamento do Ministério da Saúde, em 2020, havia cerca de 400 mil ostomizados, com estimativa de 10 mil novos casos ao ano.

Para a ex-presidente da Associação Paranaense dos Ostomizados, Luiza Helena Ferreira Silveira, a alta de casos de ostomia não tem acompanhado o crescimento adequado na conscientização a respeito da prevenção, do tratamento e de como lidar com a nova condição de vida após a cirurgia de ostomia. Para ela, uma data oficial dedicada ao tema é essencial para combater a falta de informações.

“Minha percepção como alguém que participa de uma associação que recebe um grande número de pacientes recém-ostomizados é de que a falta de divulgação dessa questão de saúde é um grande problema. Fala-se na TV e na mídia em geral sobre autismo, diabetes, pressão alta, câncer de mama, mas raramente se fala sobre a ostomia”, diz Luiza.

 “Há diversas questões de saúde que podem levar a uma ostomia. Tudo o que pudermos fazer para falar da ostomia – definitiva ou provisória – é importante para que quando acontecer com alguém próximo as pessoas saibam como lidar e saibam também que existem associações de apoio”, enfatiza.

Para saber mais sobre o movimento ou assinar o abaixo-assinado pela internet, acesse www.ostober.org